sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

A chuva


Quando começou a chover e não parou, ela correu para perto da mãe que tentou acalmá-la em vão. Sempre que chovia e não parava ela ficava aflita, os olhos
arregalados, os braços retesados ao longo do corpo e a boquinha aberta, quase em choque. A pele do rosto, sempre rosada nas bochechas, embranquecia de um jeito que qualquer um que a conhecia, ao vê-la assim, assustava-se; mas nada perto do que a chuva demorada causava nela.

Sua mãe, acostumada a não dar muita importância aquilo, já que estando viva já era estar bem, limitava-se a afagá-la mecanicamente umas duas, três vezes no máximo, e depois soltá-la dizendo "vai brincar que passa!", com certa severidade. Ela porém, nem mesmo atinava para o que a mãe dizia, tamanho era o pânico pelo qual era tomada. Ficava sem entender aqueles afagos sempre iguais e aquele desabraço prematuro. Tentava voltar para perto da mãe, já que a chuva não ia mais embora; e a mãe ali, entretida com qualquer coisa bem mais importante do que uma cisma de criança manhosa.


Uma vez foi levada pela tia à uma viagem de ônibus. A partir do momento em que subiu as escadas em direção à poltrona começou a repetir em voz alta: "já tá chegando? já tá chegando? já tá chegando?". Foi um tormento não só para a tia, como para todos os passageiros que, em sinal de desespero, compravam gibis, brinquedos e doces para a menina em todas as paradas. Houve até quem pensasse que aquilo era um toque de celular.

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