O velho fuma sentado no balanço colorido da praça infantil. O céu ameaça com uma chuva fraca, dessas que não molham direito. O cigarro do
velho queima devagar
enquanto ele espicha o olhar num esforço inútil para ver,
através de um muro em construção, o campo agora imaginário.
Estava tudo ali ainda ontem. O pasto gasto, o riacho
fino, uns cavalos magros; ao fundo a estreita plantação de eucalipto que peneirava o
bananal escarpado. O que dali se vê agora são só as copas dos
eucaliptos sacudindo-se sem corpo. Perdeu a graça aquela praça.
O cigarro se apaga com a chuva que engrossa. O velho balança levemente sua apatia com os pés fixos na faixa careca do gramado, sem perceber que está todo encharcado. Talvez pelo desgosto de perder a
vista, ou pelo calor provocado pela cachaça barata que recém tomara. Tomara que
esse muro caia assim como a chuva, primeiro lenta e silenciosamente, depois
ruidosa e decisivamente.
No bolso da camisa antiga o maço de cigarros está
ensopado. O isqueiro não presta para mais nada. A esta altura da vida do velho
quase mais nada presta. A vista que só foca ao longe agora encontra o muro no
trajeto. O muro é cinza e o céu é cinza, como tudo o que caiu no chão
enquanto a brasa do cigarro ainda ardia.
Caro amigo, que texto inspirado!
ResponderExcluirA melancolia desta cena e por ter eu hoje batido o olho no nome de Walter Ulbricht na Internet me fez plantar este triste homem na Alemanha do pós-guerra, no lado oriental, onde diante dele foi erguido o mundo de Berlim. Certamente os houve como ele muitos, com o olhar vago e sem esperanças. Onde havia um horizonte de de liberdade impunha-se agora um paredão cujos alicerces foram lançados muitos anos antes por uma ideologia desumana e seus tijolos enfileirados por outra ainda pior. Eu sem dúvida o enxergo ali.
Parabéns, amigo, belo texto.
Abraço
Jorge, estou feliz e honrado com seus elogios e comentários.
ExcluirMuito obrigado!
Não poderia ser diferente mano... você tem uma linda estrela! Bjs
ResponderExcluirValeu, lindona!
Excluir